sábado, 1 de março de 2014

DECEPÇÃO



[Editorial publicado no jornal O DIA em 19.02.2014: "Um acinte à economia nacional"]


Reiteradas vezes se afirmou que o Congresso brasileiro é um dos mais caros do mundo: em 2013, a estrutura bicameral sugava, por dia, R$ 23 milhões do Erário. A salgada conta punha o país no topo do ranking dos gastos em relação ao PIB. 

À época, a cada R$ 100 produzidos para a riqueza nacional, 19 centavos iam para os ralos do Legislativo. É pertinente relembrar essas cifras de tempos em tempos. Ainda mais agora, quando o ministro Marco Aurélio Mello liberou o pagamento dos acintosos supersalários a barnabés. A benevolência do magistrado permite excrescências como vencimentos de R$ 30 mil ou mais.

Em outubro, o Tribunal de Contas da União recomendara o corte dos salários de 1,8 mil funcionários que ganhavam acima do teto - o parâmetro é o vencimento dos ministros da Corte. A Câmara e o Senado ratificaram. Até então, desperdiçavam-se, anualmente, R$ 517 milhões com o pagamento dessa gente.




Na liminar, o juiz do STF alegou que os servidores deveriam ter sido avisados do corte. Daí ter restituído a gastança. Estranha um dos julgadores do Mensalão, saga contra o vazadouro de recursos para financiar uma política escusa, manifestar-se a favor de um acinte à população, numa época em que a economia rateia, o cenário externo não ajuda e os gastos da máquina só incham.

Os funcionários agraciados com os supersalários deveriam ter sido os primeiros a expor as irregularidades. Mas no Brasil, pátria-mãe da Lei de Gérson e das farras bancadas com o dinheiro dos contribuintes, empreendem-se esforço hercúleo para ocultar o malfeito.

É pena que o Judiciário prenda-se a ritos e a justicismos mesmo diante de uma aberração. É ilegal haver salários acima do teto. É escandaloso que quase dois mil servidores o recebam. É imoral que se mantenham a canetadas.

Espera-se que o Pleno do Supremo reveja essa decisão e dê aos trabalhadores brasileiros uma justa e necessária economia.


POST-SCRIPTUM:

Depois de nos dar motivo de orgulho com a condenação da camarilha do Mensalão, agora um ministro do STF sai com uma dessas. Fica difícil engolir. Decepção, pura decepção...

Infelizmente a decisão é embasada em critérios jurídicos, já que uma mudança como essa, em princípio, não pode retroagir. Grande parte desses supersalários existe porque a lei permitiu o acúmulo de vencimentos. Se algo tiver que mudar terá de ser para frente.

Que sejam urgentemente mudadas, então, as leis para que se evite o surgimento de novos marajás ganhando acima do teto. 

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