domingo, 2 de agosto de 2009

COOPERAÇÃO OU EXTINÇÃO?



























A guerra sempre foi inerente ao homem em sua escalada civilizatória na mesma medida em que a violência e o conflito, de uma forma ou de outra, são também inerentes à própria existência como um todo, o que é fácil de constatar se tivermos a honestidade intelectual de observar a realidade em todas as suas instâncias com a devida isenção.

Podemos supor, entretanto, que o 'homo sapiens' esteja também sujeito à evolução social, além da biológica, e que a mesma, eventualmente, reforce a tendência a sofisticar as formas de resolução dos conflitos, substituindo a opção das guerras propriamente ditas por outras menos violentas como, por exemplo, o debate e a diplomacia.

Quando falo em ‘evolução social’ devo admitir que o faça baseado em certas observações empíricas inegavelmente discutíveis (o paralelo com a evolução biológica, por exemplo), porém não totalmente descabidas; mas também o faço por uma opção pragmática (prefiro apostar que ‘o copo está meio cheio’ do que ‘meio vazio’) e por convicção ideológica (uma fé difusa e aparentemente irracional no potencial do gênero humano, mas as aparências às vezes enganam). Entretanto não acho desejável a opção pela extinção completa da agressividade, uma vez que é dela, em última análise, que depende o instinto de sobrevivência de qualquer organismo vivo.

A questão da guerra, especificamente, assim como outras questões que envolvem interesses particulares de indivíduos ou grupos, não será resolvida com um discurso moral por si só decadente e inócuo. E ainda que manipulados por líderes desonestos, os homens continuam acreditando que fazem a guerra por motivos justos. Aliás, o que mais temos hoje são guerras ‘justas’, segundo o mesmo padrão que se usa para afirmar que a guerra é ‘imoral’.

Diz-se que a necessidade é a mãe da invenção; somente quando chegarmos ao ponto em que o homem perceba, se é que o fará (só nos resta torcer que sim), que a sobrevivência da espécie está ameaçada e que a cooperação é a única saída viável poderemos, talvez, nos tornar algo diferente do que temos sido no último milhão de anos.


"Se pensarmos em quantas coisas além de fronteiras entre estados as guerras da história decidiram, temos de sentir um respeitoso assombro, a despeito de todos os horrores. Nossa verdadeira civilização, tão boa quanto ruim, teve as guerras passadas como condição determinante" (William James)


DESTINO E O SENTIDO DA VIDA





































A questão de haver ou não um sentido ou propósito para a vida depende simplesmente da opção consciente de cada ser pensante. Tais coisas não existem independentes de quem as concebe; somos nós, tanto enquanto indivíduos quanto coletivamente, que decidimos se as há ou não, e quais seriam as mesmas, ainda que sujeitos ao ambiente cultural em que nascemos.

Quanto ao ‘destino’, é mais provável que não exista, pelo menos não de forma absoluta; certamente existe alguma pré-determinação, decorrente seja das condições iniciais do próprio universo, seja da nossa circunstância imediata, manifestando-se como certa tendência imanente; entretanto é razoável acreditar que, ainda assim, certamente deve haver um amplo espaço para que criaturas inteligentes interfiram de forma significativa no desenvolvimento do próprio universo como um todo, bem como no de suas próprias vidas individuais.

Apesar de que, de certa forma, uma distinção rigorosa entre 'destino' e 'acaso' talvez não passe de uma questão semântica. É o que alguns filósofos chamariam de "um falso problema", uma vez que, se existirem, não há como termos controle sobre um ou outro, por mais que criemos artifícios inteligentes para tentar, supostamente, contorná-los e que garantam de forma definitiva e absoluta nossa tão venerada segurança, nem nosso tão desejado conforto, num universo que só se deixa compreender até certo ponto. 

Como bem coloca Jennifer Michael Hecht, a autora do livro 'Dúvida: Uma História', "vivemos entre duas realidades divergentes: existe um mundo em nossa cabeça - e em nossa vida, enquanto não somos contrariados pela morte ou pela catástrofe - e um mundo para além da vida humana - também real, mas onde não há mostras de providência ou valor, planejamento ou julgamento, amor ou alegria", pelo menos aparentemente, eu diria. E continua: "vivemos em meio a uma ruptura de significados porque somos humanos e o universo não é".

"Passamos a vida inteira às voltas com um mistério intrigante e nem sequer temos esperança de chegar a uma resposta, se é que alguma existe. (...) os problemas precisam ser resolvidos, mas os mistérios têm de ser desfrutados intactos - aliás seríamos mais felizes se encarássemos o universo e a existência como mistérios."

Pode-se até discordar no todo ou em parte, mas não há como negar que faz mais sentido do que muitas idéias religiosas que circulam por aí prometendo recompensas ou castigos eternos no além-túmulo.

Toda essa questão relativa à oposição entre uma realidade acidental ou necessária nos obriga também a contemplar o lugar do "livre-arbítrio" nesse esquema de coisas; destino, acaso, ação voluntária: parafraseando a atividade matemática, como formular uma 'equação' que dê sentido vital a nossa existência tão particular como entidades pensantes, tanto individual quanto coletivamente, utilizando tais 'incógnitas'? E quais conjuntos de regras e axiomas poderíamos imaginar a fim de dar consistência a tal empreitada?

A relatividade geral de Einstein; o princípio da incerteza de Heisenberg; a Teoria do Caos; o estudo dos Fractais; os números transfinitos de Cantor; o teorema da incompletude de Gödel; a lógica paraconsistente; as relações sutis e nem um pouco óbvias entre a matemática, a música e a poesia; a mitologia comparada; as diversas práticas divinatórias e os exercícios físicos e psicológicos preconizados por tradições místicas tanto ocidentais quanto orientais. Estas e inúmeras outras conquistas do pensamento tanto científico quanto religioso, mas acima de tudo filosófico, podem nos dar pistas significativas para apontar o 'caminho' (ou 'caminhos').

Caminho este que - segundo as mais eminentes tradições espirituais (o Zen-budismo, a Kabbalah, o Sufismo, o Taoísmo, etc.) - é mais importante que o porto de chegada. Até porque (e pedindo licença a Fernando Pessoa) tal porto não está lá para que atraquemos nossas míseras - ainda que imponentes - caravelas, feitas de imaginação e vontade, que navegam, com precários - mas também não menos imponentes - instrumentos, sobre o oceano do Abismo. 

Entretanto, algumas daquelas mesmas tradições veneráveis dizem que tal porto está bem perto: aqui mesmo, dentro de nossos corações e mentes, a apenas algumas remadas de distância do egoismo e da vaidade...

Tudo isto me lembra a cena final do filme "Forrest Gump - O Contador de Histórias" em que o protagonista tem uma 'conversa' com sua falecida esposa diante do túmulo da mesma: 

"Minha mãe dizia que a morte faz parte da vida. Eu queria que não fizesse. Eu não sei se cada um de nós tem um destino ou se estamos apenas flutuando por aí, ao acaso, numa brisa. Mas eu acho que são ambos. Talvez as duas coisas estejam acontecendo ao mesmo tempo".


GRANT MORRISON E SUPERMAN




Grant Morrison (autor da HQ adulta e anarco-psicodélica “The Invisibles”), famoso pela abordagem pouco convencional de suas narrativas, concedeu há algum tempo atrás uma entrevista onde fez comentários a respeito do ‘Superman’ e dos ‘super-heróis’ em geral, no contexto da cultura ‘pop’ globalizada:

"Nós desconstruímos nossos ícones. Sabemos que os políticos são uns mentirosos filhos da puta e que os ‘superstars’ da música, do cinema e da TV são viciados em drogas, maníacos sexuais ou meros idiotas egoístas e narcisistas, bem como que as lindas supermodelos são bulímicas neuróticas e caóticas e que nossos comediantes prediletos vão virar alcoólatras pervertidos ou deprimidos suicidas. Os diversos ‘reality shows’ da vida colocam diariamente um espelho escaldante diante das nossas caras de babuíno e das nossas obsessões óbvias e ridículas pela sujeira mais baixa e a fofoca mais inútil. Sabemos que estamos destruindo a atmosfera e extinguindo os ursos polares, mas nem ao menos temos mais energia para sentir culpa. Que os pedófilos levem nossas crianças: não há mais a quem recorrer ou culpar, fora, paradoxalmente, aqueles ‘caras’ levemente medievais que começaram a revolução industrial. No que resta acreditar? O único homem de verdadeira moral e de verdadeiro coração que nos resta é um personagem fictício dos quadrinhos! Os únicos modelos seculares a serem seguidos em uma cultura supostamente progressista, responsável, racional-científica e iluminada são, por incrível que pareça, Kal-El de Krypton, mais conhecido como ‘Superman’, e seus descendentes multicoloridos.”

E aí?