terça-feira, 3 de novembro de 2009

GAIA CIÊNCIA





































MINHA FELICIDADE

Depois de estar cansado de procurar
Aprendi a encontrar.
Depois que um vento se opôs a mim
Navego com todos os ventos.



AOS VIRTUOSOS

Até mesmo nossas virtudes devem ter o passo leve:
Para ir e vir, como os versos de Homero.



O DESDENHOSO

Como ando semeando ao acaso
Tratam-me de desdenhoso.
Aquele que bebe em copos muito cheios
Deixa-os transbordar ao acaso -
Não continuem a pensar mal do vinho.



A PALAVRA AO PROVÉRBIO

Severo e suave, grosseiro e fino,
Familiar e estranho, sujo e puro,
Lugar de encontro dos loucos e dos sábios:
Eu sou, quero ser tudo isso,
Ao mesmo tempo pomba, serpente e porco.



O CORAJOSO

Mais vale uma inimizade de boa madeira
Que uma amizade feita de madeira colada!



FERRUGEM

Necessitas também de ferrugem: ser cortante não basta!
Senão dirão sempre de ti: "É muito jovem!"



ALMAS PEQUENAS

Odeio as almas pequenas:
Não tem nada de bom e quase nada de mau.



CONTRA A VAIDADE

Não te infles, caso contrário,
A menor picada te fará explodir.



INTERPRETAÇÃO

Se vejo claro em mim, eu me envolvo em mim mesmo,
Não posso ser meu próprio intérprete.
Mas aquele que se eleva sobre seu próprio caminho
Leva com ele minha imagem à luz.



REMÉDIO PARA O PESSIMISTA

Tu te queixas porque não encontra nada a teu gosto?
Então, são sempre teus velhos caprichos?
Ouço-te praguejar, gritar, escarrar -
Perco a paciência, meu coração se despedaça.


Ouve, meu amigo, decide-te livremente,
A engolir um pequeno sapo gordo,
Depressa e sem quere olhar para ele! -
É remédio soberano contra a dispepsia.



O VIAJANTE

"Acabou o atalho! Abismo em volta e silêncio de morte!"
Assim o quiseste! Por que deixas-te o atalho?
Atrevido! É o momento! O olhar frio e claro!
Estás perdido se acreditas no perigo.



O SOLITÁRIO

Detesto tanto seguir como conduzir.
Obedecer? Não! E governar, nunca!
Aquele que não é terrível para si, não incute terror a ninguém,
E só aquele que inspira terror pode comandar os outros.
Já detesto guiar-me a mim próprio!


Gosto, como os animais da floresta e dos mares,
De me perder durante um bom tempo,
Acocorar-me, sonhando, em desertos encantadores,
De me chamar a mim mesmo, por fim, de longe,
E de me seduzir a mim mesmo.



SEM VONTADE

Seu olhar é sem vontade e vocês o honram por isso?
Pouco lhe importam suas honras;
Tem o olho da águia, olha para longe,
Não os vê! Apenas vê estrelas, estrelas!



HERACLITISMO

Toda a felicidade na terra
Amigos, está na luta!
Sim, para tornar-se amigo
É necessária a fumaça da poeira!


Em três casos os amigos estão unidos:
Irmãos diante da miséria,
Iguais diante do inimigo,
Livres - diante da morte!



CONSELHO

Aspiras à glória?
Escuta, pois, um conselho:
Renuncia a tempo, livremente,
À honra!



JUÍZO DOS HOMENS FATIGADOS

Todos os esgotados amaldiçoam o sol:
Para eles o valor das árvores - é a sombra!



O CÉTICO FALA

A metade de tua vida já passou,
O ponteiro avança, tua alma estremece!
Há muito tempo já ela gira,
Ela procura e não encontrou - e ainda hesita?


A metade de tua vida passou:
Foi dor e erro, de hora em hora!
Que procuras ainda? Por quê?
- É justamente o que procuro - o que eu procuro!



ECCE HOMO

Sim, sei de onde venho!
Insatisfeito como a labareda,
Ardo para me consumir.
Aquilo em que toco torna-se luz,
Carvão aquilo que abandono:
Sou certamente labareda.



(Trechos selecionados de "Brincadeira, Astúcia e Vingança - Prelúdio em Rimas Alemãs" in Nietzsche, "A Gaia Ciência")


segunda-feira, 2 de novembro de 2009

JUDAÍSMO



























[Adaptado de um artigo publicado na 'Folha de São Paulo' da autoria de Mateus Soares Azevedo, jornalista e ensaísta, mestre em história das religiões pela USP e autor de "Mística Islâmica", Ed. Vozes, 2002]



"Insensatos, prestai atenção: recebei minhas instruções com maior gosto do que se recebêsseis dinheiro, pois a Sabedoria vale mais do que todas as riquezas. Comigo estarão a glória, a opulência e a justiça. Feliz o homem que ouve a Sabedoria."




Extraídas dos Provérbios, de autoria de Salomão, são as palavras da "Sabedoria" personificada. Elas assinalam o lugar privilegiado do conhecimento no judaísmo, tradição monoteísta que tem seu eixo num livro sagrado. A 'Torah' (que corresponde ao Pentatêuco, os cinco primeiros livros da Bíblia) contém os Dez Mandamentos, principal legislação do Ocidente dos últimos 3.000 anos.

Até hoje não colocada em prática ("não matarás, não roubarás..."), é tão central que ultrapassou suas fronteiras originais, sendo incorporada pelo cristianismo e pelo islã. Distintamente dessas religiões missionárias, que buscam prosélitos entre todos os povos, o judaísmo não busca conversos e só raramente os aceita.

O judaísmo legou também os Salmos de Davi, venerados pelos cristãos, e os livros sapienciais de Salomão. Davi fez de Jerusalém sua capital, há 3.000 anos, e Salomão construiu o Templo. Destruído em 600 a.C. e reconstruído, foi arrasado em 66 d.C. pelos romanos. O Muro das Lamentações é o que restou dele.

A derrota para os romanos marca a Diáspora - a difusão dos judeus pelo mundo. Curiosamente, a despeito das tensões, suas comunidades somente prosperaram em terras do islã ou do cristianismo. Vem da Espanha muçulmana um dos ápices de sua cultura, com espetacular florescimento da mística e da filosofia, como testemunhado pelo 'Zohar - Livro do Esplendor' -, principal exposição do esoterismo judaico, e pelas obras de Maimônides.

Há ainda o messianismo. Em oposição ao cristianismo e ao islã, para os quais o Messias já veio, certa vertente do judaísmo sustenta que ele ainda está por vir, não necessariamente na forma de uma pessoa, como Jesus ou Maomé, mas certamente para implantar paz e justiça universais. Algo como uma Nova Era sem data marcada. Imagina-se então o fim da Diáspora.

Não se deve confundir essa concepção com o moderno sionismo. Sua ideologia nacionalista e expansionista é uma secularização do ideal messiânico. O sionismo não é parte constitutiva da religião; ainda hoje rabinos se lhe opõem tenazmente, como Moshe Hirsch, de Jerusalém, que prega a devolução integral das terras tomadas na Palestina.


http://olharglobal.blogspot.com/2008/02/judaismo-anti-semitismo-sionismo.html

SUBSTITUTOS






































Escrita por Robert Venditti e desenhada por Brett Weldele, "The Surrogates" é uma das histórias-em-quadrinhos de ficção-científica de maior repercussão nos Estados Unidos nos últimos tempos.

Isso se deve em muito ao fato de ter dado origem a um filme do mesmo nome - batizado no Brasil como "Substitutos" - estrelado por Bruce Willis e dirigido por Jonathan Mostow (de "Exterminador do Futuro 3: A Rebelião das Máquinas").

O ponto central da trama original (na HQ), que se passa em Central Georgia Metropolis em 2054, são os assim-chamados 'substitutos', uma combinação de robôs e inteligência artificial que permite às pessoas viverem suas vidas remotamente em corpos artificiais, aparentememte sem correr nenhum risco a sua integridade física. Estes substitutos são equipados com sistemas cibernéticos de 'feedback' sensorial que permitem ao proprietário/operador o controle do mesmo como se estivesse presente no local.

Vale a pena assistir ao filme que, se não chega a ser totalmente fiel a sua fonte de inspiração, também não subverte o tema original a ponto de torná-lo irreconhecível, além de ser uma produção satisfatoriamente competente e interessante por seus próprios méritos.






O MECANISMO DE ANTICÍTERA: CALCULADORA ASTRONÔMICA DA GRÉCIA ANTIGA






















(Condensado e traduzido a partir do artigo “Decoding the ancient Greek astronomical calculator known as the Antikythera Mechanism”, publicado na revista Nature #444, pp. 587-591, de 30 de novembro de 2006, da autoria de T. Freeth, Y. Bitsakis, X. Moussas, J. H. Seiradakis, A. Tselikas, H. Mangou, M. Zafeiropoulou, R. Hadland, D. Bate, A. Ramsey, M. Allen, A. Crawley, P. Hockley, T. Malzbender, D. Gelb, W. Ambrisco e M. G. Edmunds)



O mecanismo de Anticítera é um dispositivo único, construído na Grécia em torno do final do século II A.C., que permitia calcular e exibir informações celestes, particularmente ciclos como as fases da lua e um calendário lunar-solar.

Calendários eram extremamente importantes para as sociedades antigas, tanto no que se referia à regulação das atividades agrícolas quanto na fixação de festividades religiosas. Os eclipses e os movimentos planetários eram por vezes interpretados como augúrios, mas podemos supor que a invariável regularidade dos ciclos da astronomia deve ter sido filosoficamente atraente em um mundo incerto e violento.

Batizado com o nome do local de sua descoberta em 1901 em meio aos destroços de um naufrágio romano ocorrido na Antiguidade (cerca do séc. I A.C.), o mecanismo de Anticítera é tecnicamente mais complexo do que qualquer dispositivo conhecido que tenha sido construído até pelo menos um milênio depois.

Suas funções específicas permaneceram controversas durante várias décadas em virtude do estado fragmentário de suas engrenagens e das inscrições em suas faces, após ter permanecido submerso por tantos séculos.























Em decorrência de exaustivas pesquisas, efetuadas por intermédio de tomografia radiográfica de alta resolução dos fragmentos encontrados, foi possível reconstruir o mecanismo e decifrar suas inscrições numéricas. Sua função seria a de prever eclipses lunares e solares usando como base os ciclos de progressão aritmética babilônicos. As inscrições dão respaldo também à suposição de exibição mecânica das posições planetárias, uma parte do artefato que se supõe tenha-se perdido no referido naufrágio.

No século II A.C., Hiparco desenvolveu uma teoria para explicar as irregularidades do movimento aparente da lua pelo céu, as quais seriam causadas por sua órbita elíptica. Podemos encontrar uma aplicação prática desta teoria na utilização do mecanismo, revelando um inesperado grau de sofisticação técnica para o período.


http://www.nature.com/nature/journal/v444/n7119/abs/nature05357.html