quarta-feira, 30 de abril de 2014

O ESPANTO: CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE DA FILOSOFIA

[Texto de autoria de Moisés Efraym]


Quando nascemos, por termos desconhecimento total a respeito das coisas que nos cercam, desenvolvemos o hábito, ainda crianças, de nos admirarmos com tudo que se faz objeto de nossa sensibilidade. Na medida em que vamos nos desenvolvendo passamos a assimilar todo um "complexo conceitual" transmitido como referencial necessário à convivência social.

Esse contato, que tem um caráter exclusivamente sensível a princípio, põe a realidade circundante sempre no âmbito da experiência nova pela completa indisposição de parâmetros que estabeleçam um critério de identidade: as "coisas" são não apenas novas, mas também, e principalmemnte, diferentes entre si; nesse estágio, a criança percebe de forma mais apurada do que a maioria dos adultos que sequer existem duas pessoas iguais.




O "complexo conceitual" acima referido é internalizado de maneira quase imperceptível pela criança. Dessa forma vão moldando-se, num processo necessário, as relações entre o sensível (porta de entrada das impressões) e o racional (que respalda e ratifica o tal "complexo conceitual"), os quais identificam e perpetuam a realidade externa como um amontoado de coisas passíveis de fácil reconhecimento a partir de critérios internos de diferenciação.

A previsibilidade conseguida por intermédio de tais critérios proporciona ao indivíduo já "crescido" um asseguramento que tende a priva-lo da percepção do caráter mutável das coisas que este tem como certas, como dadas, como "já sabidas" (o estereótipo de beleza física eurocêntrico, por exemplo).




Para uma compreensão da realidade sob a ótica da filosofia faz-se necessário que desenvolvamos novos modos de abordagem que promovam a equivalência entre a razão (que registra) e a sensibilidade (que "absorve" os diversos aspectos do que nos circunda). Ambos, quando equilibradamente considerados, permitem a observação necessária à percepção adequada da realidade como movimento permanente de diferenciação de tudo que existe.

Uma vez alcançado esse estágio, o indivíduo desenvolve a condição que conduz à possibilidade de realização da filosofia - o espanto, a admiração originária - que nada mais é que um retorno à infância, com a vantagem de promover uma inocência com consciência. Esta é a condição de acontecimento e continuidade da filosofia como tal.

 

Como o "complexo conceitual" mostra-se necessário enquanto forma de apreensão da linguagem do real, a questão reside no fato de promover-se sua superação a um estágio consequente, que tem nas três metamorfoses de Nietzsche um ótimo referencial para sua compreensão.

O camelo tudo aceita, o leão tudo impõe, o menino tudo contempla. Quando se dá a realização da terceira metamorfose nasce a inocência consciente necessária à filosofia, nasce a possibilidade de realização da filosofia em sua plenitude.


POST-SCRIPTUM:








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