sexta-feira, 20 de março de 2015

SOMOS VIÁVEIS? (1)

    




  [ARNALDO BLOCH; O GLOBO - SEGUNDO CADERNO; 07.03.2015]

Um dos traços característicos da espécie humana é a crença de que, entre os demais seres vivos conhecidos, estamos no topo da evolução. Nossas capacidades de refletir sobre nós mesmos, formular hipóteses, destrinchar as causas naturais para os fenômenos e nossa consciência, que permite transcender o simples viver, são consideradas valiosas. Mas nunca perguntamos: valiosas para quem e para quê?
O planeta se lixa para nós. O Cosmo não está nem aí. Os animais são esculachados. As florestas, montanhas, geleiras; os mares, os rios - estão indo para o brejo. Resta, então, a hipótese de que somos valiosos para nós mesmos. De que nossa busca é o estágio em que o Universo toma consciência de si, num processo que ainda está na infância, mas resultará, um dia, em algo grande para nós e para o todo.


Mas, se olharmos com cuidado, a julgar pelo ponto a que chegamos, nem essa hipótese (sermos valiosos para nós) se sustenta. No máximo, pode-se considerar que um indivíduo pode ser feliz por um tempo determinado, mas nem isso é uma obra que a espécie realizou: é um benefício que a vida, a natureza, conferem a um ser, e pelo qual deveríamos agradecer humildemente.

De resto, que evolução é esta que o humano alcançou? Mesmo dentro de nossas conceituações do que seja bom ou mal para a Humanidade, qualquer progresso que se verifique está, sempre, sub judice. A própria ideia de progresso vive em xeque: o crescimento irrefreado, que é o ideal de qualquer pensamento econômico aceito, é obviamente destinado ao desastre. Mesmo se deixarmos de lado os sinais claros de que esse paradigma está destruindo a vida em sociedade, é uma questão de matemática rudimentar: a Terra tem uma determinada extensão. Logo, a multiplicação de objetos, edificações, veículos, propriedades, e da população, tem um limite. De espaço, de recursos, de energia, de meios, de motivação.

Mesmo assim, o crescimento, puro e simples, infinito, é o único que vale para qualquer índice que calcule a prosperidade de uma nação, como se não houvesse um horizonte final (em outras palavras, danem-se as próximas gerações, o que importa é o mundo agora). Se há um discurso e um movimento planetários em prol da preservação ou até conceitos malucos como o do descrecimento, a comunidade das nações não dá qualquer sinal de que possa haver uma concórdia sobre as providências no sentido de uma decisiva mudança de postura global.

Falam mais alto as paixões, a sede de potência e de acúmulo, guiados pela certeza da morte, e a compulsão pela otimização do gozo numa corrida contra o relógio que leva a tumba.

POST-SCRIPTUM:


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