domingo, 28 de junho de 2009

INCONSCIENTE COLETIVO




Quando se fala em Deus ou deuses vem-nos logo à consciência a concepção tradicional do termo conforme supostamente teria se cristalizado nas assim chamadas "mentes primitivas", e era a esse tipo de "deus" que tanto Marx, Freud ou mesmo Nietzsche se referiam, obviamente em contextos diversos.

Mas de lá para cá, graças a desenvolvimentos nas áreas da psicologia, da antropologia e da sociologia, muitas informações novas foram acrescentadas àquilo que veio a ser entendido como o "fenômeno religioso" - a partir de então considerado como inerente à elaboração do psiquismo humano, projetando-se tanto em sua produção artística quanto em suas relações socioculturais - informações estas a que os citados pensadores não tiveram acesso.

Isto não tem nada a ver com acreditar num ser todo-poderoso, eterno, onipotente e onipresente, ainda que ingenuamente antropomórfico ou, em outro extremo, acreditar numa inteligência teleológica que a tudo tenha gerado conscientemente - invisível mas invariavelmente concebida em moldes ridiculamente humanos - até porque tais raciocínios nos levam a contradições absurdas e sem solução.

Porém as idéias existem e Deus seria, antes de tudo, uma idéia radical, um conceito indefinível, um arquétipo, um "meme", e não necessariamente um ente concreto como as religiões tradicionais o querem, mesmo que certos atributos "divinos" (se ousarmos relativizar o termo e ao mesmo tempo nos permitir um exercício de especulação) possam ter sido incorporados - ou serão ainda, quem sabe - por determinadas entidades, materiais ou incorpóreas, orgânicas ou cibernéticas, na vastidão aparentemente caótica de possibilidades infinitas da multiplicidade e de alernativas aleatórias (ou nem tanto) do devir.

As idéias não podem ser responsabilizadas pelas concepções equivocadas daqueles que nelas acreditam e sim o oposto. O pensamento também evolui e se transforma, extraindo vida nova do contato e do intercâmbio entre as culturas e os indivíduos.

Certos conceitos, em virtude de seu próprio estatuto ontológico, tem força e podem mudar o mundo e as consciências, isso é incontestável. E é a concepção de algo como uma espécie de 'ponto zero', uma fonte praticamente inesgotável de energia que brota das trevas subjacentes à mente consciente, um poder difuso e ainda inexplicável - porém patente - o que, em última instância, dá sentido às tradições esotéricas e exotéricas da Antiguidade e posteriores (inclusive aquelas mais recentes) como, por exemplo, os oráculos délficos e o orfismo diosnisíaco da Grécia antiga, bem como outros rituais extáticos em diversas partes do globo e ao longo da História e da mitologia de todos os povos: o xamanismo dos povos nômades primitivos, o hermetismo egípcio, a intuição profética dos antigos hebreus, o zoroastrismo persa, o neoplatonismo, o budismo tântrico, o hinduísmo, o xintoísmo, a meditação zen, o candomblé, a Alquimia, a Gnose, o Espiritismo, etc.

Minha visão pessoal é de que tudo no universo estaria de alguma forma ligado a esta “fonte”, um campo fundamental (como na Física) que a tudo permeia, e que se manifestaria de forma mais visível nos seres vivos, notadamente no homem, sendo, em última análise, a origem do pensamento tanto em sua forma consciente quanto inconsciente; assim, a mente racional (assim como a irracional: a emoção e os instintos) seria não só o resultado de um impulso evolutivo de origem meramente eletro-química em direção a uma complexidade cada vez maior mas também de uma tendência imanente à realidade material e isto se evidenciaria mais claramente nas manifestações psíquicas relacionadas à intuição e a imaginação criativa.

A chave para uma melhor compreensão desta "força", em minha opinião, estaria no estudo aprofundado do inconsciente coletivo, conforme postulado pelo psicólogo Carl Gustav Jung, este "universo subterrâneo" que jaz semi-adormecido nas profundezas da mente humana.


NIETZSCHE É POP?





































Quero mandar um alerta com relação ao grande perigo que corre todo aquele que detêm certo requinte cultural, que é o de desprezar qualquer manifestação artística que tenha o rótulo de "pop" sem nem ao menos tomar conhecimento de seu conteúdo.

Se por "pop" entendermos alguma coisa que é conhecida e admirada por muitos, seria ótimo que a obra de Nietzsche, por exemplo, fosse realmente "pop", o que não é o caso. Realmente as referências a ele estão se tornando cada vez mais frequentes na cultura popular em geral, mas ainda em um nível muito rasteiro.

O perigo que correm suas idéias em nossos dias é de que venham a se tornar "pop" de uma forma mais generalizada enquanto corrompidas por deformações inconvenientes (como ocorreu em sua apropriação parcial pela ideologia nazista). Pois aí correremos o risco de cair naquela outra definição possível para "pop", uma ditadura comportamental demonizando tudo aquilo que está do outro lado.

É fundamental que se conheça a história da filosofia para que se possa ter uma compreensão mais ampla do pensamento de qualquer filósofo, situando-o dentro de um contexto geral. Aliás, não só de história da filosofia, mas também de história da arte, bem como da história humana de uma forma geral, tanto quanto de matemática, ciências naturais (física, química e biologia), literatura, psicologia, sociologia, antropologia, economia, etc. As barreiras acadêmicas determinadas pela pedagogia positivista são, em grande parte, responsáveis pela falta de profundidade reinante no diálogo entre os "saberes" das elites pensantes (e elas sempre existiram e existirão, com maior ou menor grau de responsabilidade social).

Extremamente pertinente a esse contexto é observar-se a interação crescente entre as diversas visões de mundo que permeiam o imaginário da população leiga em geral, promovida em grande parte pela indústria do entretenimento; um choque cultural decorrente da multiplicidade natural, bem-vindo e inerente à historicamente inédita condição de "aldeia global" reinante em nosso planeta e do presente e saudável (pelo menos em tese, ainda que não totalmente concretizado) desejo de vivermos em harmonia com nossos semelhantes, num ambiente de respeitosa convivência democrática.

Justamente por isso o momento atual carece de um novo projeto pedagógico e ideológico no sentido de garantir de forma honesta e sem deformações tudo aquilo de valioso que nos foi legado por pensadores como Nietzsche e tantos outros; principalmente, e isso é fundamental, quando este preconiza não somente a denúncia e o abandono daqueles "velhos valores" que nos impedem de enxergar mais longe (e cabe a nós identificá-los por critérios rigorosos), mas também a reforma de outros tantos, bem como ainda a criação de novos (e eu diria também o resgate de alguns dos "velhos", hoje esquecidos, mas não menos úteis) que nos permitam ir "além". E para tal fim deve-se considerar como importantíssimo o papel do artista, na medida em que esse é um criador de novos mundos e de novas idéias.


APOLOGIA DA PAZ: PALESTINA x ISRAEL (UM DESABAFO)


















Gostaria, antes de tudo, de esclarecer que nem todo judeu é sionista ou apóia a estratégia beligerante do Estado de Israel. O que se passa, hoje, por sionismo, em Israel, é herança do sionismo revisionista, uma facção fascistóide entre inúmeras que existiam, tanto de direita quanto de esquerda (até porque o sionismo nunca foi doutrinariamente unificado e coeso, possuindo diversas versões com propostas divergentes entre si).

Meu pai, ainda hoje vivo, é um judeu polonês naturalizado brasileiro; minha mãe, também viva, é brasileira e nordestina, nascida no estado de Pernambuco, 'meio' católica 'meio' convertida ao judaísmo; e meus avós maternos, ambos já falecidos, eram mestiços (tenho sangue africano, indígena e europeu, com muito orgulho).

Meu pai, apesar de não ter sido uma vítima direta dos campos de concentração nazistas (ao contrário de muitos de seus familiares e vizinhos), então ainda muito jovem, lutou na Segunda Guerra Mundial como sargento do Exército Vermelho soviético contra a ameaça representada por Hitler e sua ideologia criminosa, mesmo não sendo russo e muito menos endossando incondicionalmente as barbaridades cometidas por Stálin, apesar de poder citar muitas de suas realizações em favor do povo nas áreas da educação, da saúde e do bem-estar social (algo que, evidentemente, não justifica os massacres também cometidos por ele contra seus opositores).

Sou, portanto, judeu e (parcialmente) descendente de judeus - meu avô paterno era escritor e tradutor de alguns clássicos da literatura ocidental para o 'iídishe' e meu bisavô um estudioso da 'Kabbalah' - e me identifico com muito do que diz respeito ao judaísmo, mas também sou, antes de tudo, brasileiro e latino-americano. Entretanto, e justamente por minha definição pessoal de judaísmo não estar ligada a uma questão meramente religiosa, cultural ou mesmo étnica, sendo mais uma ligação afetiva que qualquer outra coisa, também me considero um “cidadão do mundo”, cosmopolita, multiétnico e sem ligação formal com qualquer religião organizada ou, mais precisamente, um agnóstico com grande interesse por mitologias comparadas e por todas as antigas doutrinas místicas tanto ocidentais quanto orientais, bem como pelos assim chamados 'fenômenos paranormais' de uma forma geral.

Assim sendo, e tendo em vista minha situação particularmente 'sui generis' no que se refere a experiências pessoais em lidar com diversos tipos de preconceito, sinto-me com isenção suficiente para criticar qualquer manifestação de racismo ou intolerância, venha de onde vier.

Já estou cansado de ouvir pessoas proferirem impropérios contra os judeus ou os muçulmanos em geral e confundirem os atos de alguns grupos e indivíduos com toda uma população, além de fazerem questão de colocarem vendas sobre os olhos para não enxergarem os crimes igualmente condenáveis cometidos por ambos os lados. Não vai ser com acusações unilaterais nem com intolerância preconceituosa que se resolverão os problemas seculares do Oriente Médio.

Acusa-se Israel, por exemplo, e com certa razão, de ter 'roubado, matado e destruído', assim como o povo palestino de ser 'um bando de suicidas irracionais', mas esquece-se de que serão sempre indivíduos e facções a praticar tais atos; não faz sentido, portanto, imputar tais acusações a todo um povo, como não faz sentido acusar a todos os alemães pelo nazismo ou a todos os americanos pela bomba de Hiroshima. E ficar bradando palavras de ordem eivadas de ódio e ressentimento não me parece ser a atitude de alguém que tenha um mínimo de inteligência e bom-senso. Se exageros são cometidos por alguns, eles devem ser expostos e condenados, porém sem essa virulência que põe 'todos os gatos no mesmo saco'.

Diante da complexidade desta situação, quero proclamar em alto e bom som minha posição pessoal em relação ao aqui exposto: sou contra a ação desproporcional e criminosa do exército israelense, assim como também sou contra o Hamas usar a população civil palestina como escudo contra as bombas de Israel; sou contra os ultranacionalistas de direita israelenses que não querem a criação de um estado palestino, assim como sou contra a estupidez dos homens-bomba palestinos que não admitem a existência do estado judeu; sou contra a atitude intransigente dos atuais governantes israelenses, bem como sua falta de visão do futuro, assim como sou contra a prática de ficar revirando o passado a procura de uma justificativa para o ódio, tanto quanto abomino quaisquer tentativas de negar o Holocausto.

Para reforçar ainda mais minha disposição pacifista e conciliatória, concluo fazendo minhas as palavras de Uri Avnery, uma das mais sábias vozes em Israel, quando escreve que, depois de uma vitória militar israelense, “o que ficará marcado na consciência do mundo será a imagem de Israel como um monstro manchado de sangue, pronto para, a qualquer momento cometer crimes de guerra e não preparado para obedecer a quaisquer limites morais. Isso terá consequências graves para nosso futuro no longo prazo, para nossa estada no mundo, para nossa chance de conseguir paz e sossego. No fim, essa guerra é um crime contra nós mesmos também, um crime contra o Estado de Israel”.

Entretanto, seria uma atitude muito ingenua e nem um pouco realista esperar que Israel não se defendesse enquanto sofre atentados terroristas continuamente por parte daqueles que negam até mesmo seu direito à existência. 

Quem se deu ao trabalho de pesquisar o pouco que seja a respeito da história da criação do estado de Israel pela ONU em 1948, conhece a proposta de criação de um estado palestino na mesma época, vizinho ao estado judeu, e que foi rejeitada pela comunidade dos países árabe sob alegações no mínimo discutíveis.

Enquanto ambos os lados não se conscientizarem de que somente através do dialogo e do respeito mútuo às diferenças se poderá conviver em paz e prosperar, ao invés de ceder ao ódio cego e aos interesses escusos de lideranças manipuladoras, seja no Oriente Médio ou em qualquer outro lugar do planeta, tais conflitos irracionais, em nossos dias de armas atômicas, químicas e biológicas, terão eventualmente como consequência inevitável  levar a Humanidade a se aproximar cada vez mais da extinção pura e simples.

Acredito, assim como todo aquele imbuído do mínimo de bom-senso, que tal conclusão não seja do interesse de ninguém. Ou será que a ganância e a estupidez novamente falarão mais alto?           


POST-SCRIPTUM:

Shalom, Salam, Paz a todos.


INTERPRETAÇÃO E REPRESENTAÇÃO DO REAL




















Nietzsche observou sabiamente que não há fatos, só interpretações. Nesse contexto, segundo ele, a "coisa-em-si" é um conceito sem sentido.

Tomemos portanto tal entendimento como verdadeiro em toda a sua radicalidade e exercitemos nossa imaginação...

Pegando empréstimos a Heidegger, Jung e Cantor, bem como à Mecânica Quântica e ao Taoísmo, podemos dizer que o Ser manifesta-se simultaneamente – o paradoxo em ação – como onda (inconsciente coletivo) e como partícula (inconsciente individual) e só se define por sua relação biunívoca com os entes privilegiados, ou seja, os egos dotados de razão (assim como provavelmente estes entre si), num regime silencioso de interdependência e incessante intercomunicação sincrônica e intuitiva que não se esgota justamente em função da transfinitude ontológica de suas dimensões matemática, espaço-temporal e, por falta de um termo melhor, espiritual (ou psíquica), num equilíbrio dinâmico e bipolar característico da multiplicidade, em que tanto a Vida (expansão, "luz", afirmação, explosão criativa) quanto a Morte (contração, "trevas", negação, decadência estéril) pulsam dialeticamente como no simbolismo do yin/yang, o positivo em conflito e ao mesmo tempo em harmonia com o negativo.

A aparente "salada conceitual" é proposital e mesmo inevitável porque simbólica, poética, vital e dionisíaca (a interpretação do que seja a arte, a ciência e a filosofia pode ter muito mais em comum do que geralmente se supõe).

Uma noção holística de totalidade imanente, mesmo que relativa, é extremamente relevante na manutenção do ordenamento da informação, além de fundamental para o incremento da complexidade e de sua replicação e disseminação ou, em outros termos, para a afirmação do fenômeno da vida – seja este entendido como o "élan vital" de Bérgson, como o "Espírito" de Hegel ou como subproduto da matéria bruta – em oposição ao avanço da entropia, além de ter a útil vantagem de transformar em falso problema a questão platônica dos dois mundos.

Não sei se me faço entender em minha tentativa de colocar numa justaposição aparentemente contraditória, simultaneamente de contraste e de afinidade, tão díspares interpretações ou visões de mundo, mas essa é a minha forma de representar a guerra heracliteana, as "águas do rio" que nunca são as mesmas (e, no entanto, são), tendo o paradoxo como foco de minha intervenção quântica no real.

Se não ousarmos sintetizar de forma coerente, com vistas a uma possível e futura concretização, tudo aquilo de crítico e criativo, porém afirmativo e útil – em última análise de pragmaticamente bom, diferentemente do tradicional moralismo colocado pela oposição do "Bem" contra o "Mal" – que os melhores representantes do gênero humano tiveram a nos oferecer ao longo da história do pensamento em termos de verdadeira sabedoria, então não merecemos transpor o abismo que nos separa do "para-além-do-homem".