domingo, 20 de abril de 2014

MAIS CERVEJA, MENOS PÃO


[Editado a partir de um artigo publicado em GALILEO nº 223 de fevereiro de 2010]



Patrick McGovern é diretor do Laboratório Arqueológico Biomolecular do Museu da Universidade da Pensilvânia e autor do livro 'Uncorking the Past: The Quest for Wine, Beer and Other Alcoholic Beverages'.

Diferentemente do senso comum, que costuma ligar os bêbados a uma horda de bárbaros, McGovern defende que o álcool teve um importante papel no estabelecimento das primeiras civilizações. "Quando você tem que produzir álcool suficiente para toda a sua população, é necessário se assentar em algum lugar por todo o ano, cuidar das plantas." Com o tempo, os humanos começaram a construir casas, e esses assentamentos se tornaram vilas.




"Nossa agricultura surgiu para produzir álcool. Os primeiros assentamentos humanos surgiram depois do cultivo da cevada, e é mais fácil produzir cerveja do que pão, além de ser mais nutritiva." McGovern cita o exemplo do milho na América Latina. Antes de ser domesticado, o grão não servia para ser comido, ele só era consumido transformado em bebida fermentada. "Se olharmos para os grãos como arroz, cevada, trigo, milho e sorgo, eles todos podem ser transformados em bebidas. A motivação de sua domesticação foi poder consumi-los na forma de bebida alcoólica. Só depois passamos a fazer pães e massas", diz. 


 


Avançando um pouco no tempo, McGovern aponta o comércio das bebidas como grande impulsionador de intercâmbios culturais. "Enquanto os fenícios levavam o vinho em seus barcos, espalhavam sua cultura pelo Mediterrâneo." Eram vendidas a altos preços aos nobres egípcios e europeus - inclusive para os italianos e franceses, que mais tarde seriam os grandes produtores da bebida. Eles não transportavam só a cultura do vinho, mas sua indústria, o trabalho com metais e a cerâmica. Além, é claro, da mais importante contribuição de sua cultura para o mundo: o alfabeto latino.





O vinho tornou essas trocas bem mais fáceis. "Não acho que toda transferência cultural e tecnológica tem de ser pela força, ela pode ser guiada simplesmente pelo prazer. Quando vamos para outros países experimentar suas bebidas, as pessoas podem ser muito amigáveis, ficamos interessadas por suas ideias e cultura", diz McGovern.


POST-SCRIPTUM:


Quem já leu os quadrinhos de 'Astérix, o gaulês' tem uma boa ideia a respeito do que o professor McGovern está falando...